Desempregado há três anos
no país do futuro
Batendo perna nas ruas
com o mostruário de meias
Adivinhando
o signo da morena
o ascendente da loira
Jogando xadrez
assobiando um samba
colecionando borboletas
descobrindo a fórmula exata
da tinta para balão
(tinta que não racha
sobre a pele inflável)
Contra as determinações médicas
filando cigarro
fazendo piada com a perna
que pode ser amputada
louvando as próteses modernas
dizendo que morre antes disso
que não vai dar trabalho
que some de casa
vai pro asilo
Meu pai de novo ao volante
guiando o negro Landau
O velho e bom batmóvel
rodando sem freio ou cinto
o vento de Gotham no rosto
minha cabeça no banco de couro
Meu pai cantando alto
limpo e bonito como só ele
numa estrada clara
sem pedágio ou limite
de felicidade
Novo endereço (2002)
BARRABÁS
Vocês não podem velar
o corpo do meu marido
Ao lado do desse aí
que a polícia acertou
Vocês me desculpem
imagino o sofrimento
perder um filho assim moço
Meu Cícero
morreu trabalhando
Um tiro pelas costas à
s duas da manhã
Ao lado do desse aí
o corpo dele não vai gelar
Não adianta insistir
ao lado de bandido
meu marido não fica
Ibidem
Fonte: Roteiro da Poesia Brasileira anos 90, seleção e prefácio de Paulo Ferraz, São Paulo: Global, 2001, pp. 126-127
Sobre Antonio Moura
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