SOLIDÃO
INSEGURA (Noite)
Noite de flor fechada e
veia oculta.
— Amêndoa sem coalhar de
verde tato —
Noite cortada por demais
depressa,
as folhas e as almas
abalava.
Peixe mudo pela água de
amplo som
lascivo se banhava no
tremente,
luminoso marfim,
recém-cortado
ao da lua chavelho
adolescente.
E se o centauro canta nas
ribeiras
deliciosa canção de trote
e flecha
ondas recolham glaucas
seus acentos
com uma dor de nardos sem
limites.
Lira bailava na fingida
curva,
alvo imóvel de imóvel
geometria.
Dormem na escuridão olhos
de lobo
renunciando ao sangue das
ovelhas.
No lado oposto, Filomela
canta,
umidades de heras e
jacintos,
com no ar uma
queixa de Sul louco
sobre a da fonte flauta
fixada.
Enquanto em meio do
sombrio horror
fingindo cantos e
aguardando medo
voz inquieta de náufrago
soava.
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Lírios de espuma cem e
cem estrelas
baixaram porque ondas não
havia.
Seda em tambor fica
reteso o mar,
enquanto Tetis canta e
soa Zéfiro.
Palavras de cristal e
brisa escura
redondas sim, os peixes
mudos falam.
Academia no claustro dos
íris
sob o êxtase denso e
penetrável.
Chega bárbara ponte de
delfins
onde a água se transforma
em mariposas,
colar de pranto nas
areias finas,
sem braços a voar à
cordilheira.
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Rola gelada a lua, quando
Vênus
com a cútis de sal na
areia abria
brancas pupilas de
inocentes conchas.
A noite cobre seus
precisos rastros
com chapins feitos de
fósforo e espuma.
Enquanto hirto gigante
sem latido
raspa as espáduas tépidas
sem vênera.
O céu exalta cicatriz
borrosa,
vendo mudada sua carne em
carne
que participa da funesta
estrela
e o molusco de medo sem
limite.
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Federico Garcia Lorca, Romanceiro Gitano e outros Poemas,
trad. Oscar Mendes, Rio de Janeiro: José Aguilar Editora, 1974, pp. 228-229