A Darcy Damasceno
Às vezes à minha cama vinha
intrigante, aquele sonho raro:
Diante da rainha do baralho
e seu cortejo de espadas
eu de
joelhos me prostrava:
— Cortem-me a cabeça! —
pedia e me comprazia
na dimensão do
corpo restante
e me sentia plena, sem aleijão
nadando serena em rio de sangue.
In De déu em déu - poemas reunidos (1979-1994), Rio de Janeiro: Sette Letras, 1998, p. 243.
Nesse jardim tão noturno
empilham-se crespas trevas
em
touceiras de veludo.
Alforriados do dia
giram girassóis malucos.
Como rebeldes ramagens
pulsam seres libertos
de suas soezes
grades.
Despudorados antúrios
aí proclamam os audazes
rijos membros em luxúria
e um cheiro umbroso e mordaz
nos avassala os narizes.
Frutos exóticos cevam-se
no rubro sangue do crime
coalhado
em antiga terra
enquanto à sombra de urtigas
vida e morte, unas se integram.
In De déu em déu - poemas reunidos (1979-1994), Rio de Janeiro: Sette Letras, 1998, p. 244.
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