quarta-feira, 26 de junho de 2013

Astrid Cabral

A Darcy Damasceno
Às vezes à minha cama vinha 
intrigante, aquele sonho raro:
Diante da rainha do baralho 
e seu cortejo de espadas 
eu de joelhos me prostrava:

— Cortem-me a cabeça! — 
pedia e me comprazia 
na dimensão do corpo restante 
e me sentia plena, sem aleijão 
nadando serena em rio de sangue.

In De déu em déu -  poemas reunidos (1979-1994), Rio de Janeiro: Sette Letras, 1998, p. 243.

Nesse jardim tão noturno 
empilham-se crespas trevas 
em touceiras de veludo. 
Alforriados do dia 
giram girassóis malucos.
Como rebeldes ramagens 
pulsam seres libertos 
de suas soezes grades. 
Despudorados antúrios 
aí proclamam os audazes 
rijos membros em luxúria 
e um cheiro umbroso e mordaz 
nos avassala os narizes.
Frutos exóticos cevam-se 
no rubro sangue do crime 
coalhado em antiga terra 
enquanto à sombra de urtigas 
vida e morte, unas se integram.

In De déu em déu -  poemas reunidos (1979-1994), Rio de Janeiro: Sette Letras, 1998, p. 244.


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