MEIO-DIA, CEDO
Calma reverdece a tília na abertura do Verão,
muito distante das cidades cintila
o brilho baço da lua diurna. E já meio-dia,
na fonte já se agita o jacto,
sob os estilhaços já se ergue
a asa aviltada do pássaro mágico
e a mão deformada do lance da pedra
mergulha no trigo que desponta.
Onde o céu da Alemanha enegrece a terra,
o seu decapitado anjo procura um túmulo para o ódio
e oferece-te a taça do coração.
Uma mão cheia de dor perde-se para lá da colina.
Sete anos mais tarde
de novo te lembras,
junto à fonte, às portas da cidade,
não olhes muito no fundo,
que os olhos ficam toldados.
Sete anos mais tarde,
numa casa mortuária,
os carrascos de ontem bebem
a taça de ouro até ao fim.
Baixas os olhos de triste.
É já meio-dia, nas cinzas
contorce-se o ferro, no espinho
foi içada a bandeira e nos rochedos
do sonho ancestral fica a partir de agora
agrilhoada a águia.
Só a esperança se agacha cega na luz.
Solta-lhe as grilhetas, leva-a
pela encosta, põe-lhe
a mão sobre os olhos, para que
sombra nenhuma a queime!
Onde a terra da Alemanha enegrece o céu,
a nuvem procura palavras e enche a cratera de silêncio
antes que o Verão as oiça na sua chuva escassa.
O indizível passa, sussurrado, sobre esta terra:
é já meio-dia.
[In O tempo Aprazado, Seleção, tradução e introdução João Barrento e Judite Berkemeier, Lisboa, Assírio & Alvim, 1992, pp. 35-37]
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