ÁGUA NA BOCA
Tinha uma sede impossível a terra
palácios e árvores estremeciam com aquele ar seco
até o Pai eterno dificilmente respirava.
Nasciam fogos como quem tivesse lançado gasolina
e todo o trigo e todo o milho se queimou.
Em redor a planície esboroada
até aos joelhos
transformava-se num mundo de pó que chegava às montanhas.
As florestas, enormes velas de cinza que desabam.
Pássaros e animais fugiam dos céus
e da terra, mas os escaravelhos
as lesmas e os ratos morreram de boca aberta.
Depois levantou-se um vento que parecia arrebatar
a planura e nuvens negras
ensombraram até Bolonha
estradas telhados e homens.
Começou a chover às duas da manha de quinze de outubro
depois de quatro meses e um dia.
Todos despertaram do seu sono e não acreditavam.
Pegaram em baldes, cântaros, alguidares e até em copos
e foram para o meio da estrada.
E houve descarados que dançavam.
Eu, que então tinha oito anos,
de rosto contra o céu
deixei que chovesse em minha boca.
[In Histórias para uma noite de calmaria, tradução de Mário Rui de Oliveira, Assyrio & Alvim, 2002]
quarta-feira, 20 de setembro de 2017
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