MÃO E IMAGEM
Se EU pudesse encontrar palavras muito nítidas,
se eu pudesse acertar meu horizonte íntimo
com o teu horizonte, se eu conseguisse
vencer a mútua indiferença que nos une
quanto ao passado, se eu falasse em coisas mortas
mas de um modo vivo, e sem pedir o seu retorno
então talvez compreendesses a amarga distância
das mãos que a carne modela e do coração
que o sangue inunda à ilusão construída
e à imagem feita de frases suspensas,
e talvez sentisses que as mão são trêmulas demais
para inventar novos caminhos e o coração
é fraco, é muito fraco, e se dilui dentro de nós
como a neve ao calor das chamas,
e que a boca que se cala talvez pedisse um beijo
assim, cerrada e muda, e que os cabelos
(ah, os cabelos, o mistério do humano movimento
e a distância fluindo neles, e a ternura!)
e que os cabelos, assim deitados sobre os ombros
sugerem laços e dedos que se perdem na cálida penumbra.
[In: Obra Poética, Editora Hucitec: São Paulo, 1995, p. 69-70]
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