segunda-feira, 4 de junho de 2012

Adélia Prado

Glória filosofava: toda vez que se diz "o inconsciente coletivo" ele me parece um personagem. Tal qual o bufão que entremeia as cenas no teatro, papel cuja suprema importância será revelada a todos no final. "O inconsciente coletivo" como "o Sobrenatural de Almeida" que o cronista inventou pra justificar o injustificável, o sem explicação no futebol. Confio no inconsciente coletivo, simpatizo em extremo com ele, deposito-lhe inabalável confiança. Descobri-lo me descansou da angústia catequética com as professoras na greve, com os filhos, com os alunos. Deus responderá ao nosso labor através do inconsciente coletivo. Na hora agá espero vê-lo interromper a cena escabrosa, com os sapatos imensos, a luz piscando no nariz ou no traseiro, conforme os palhaços gostam, e fazer sua intervenção, sua opção pela claridade, pelo brilho da espada, se for preciso. Pela misericórdia. O inconsciente coletivo quer um país com rebanhos e lavouras de milho, viola, namoro, noivado, casamento, dor de parto, panelas fumegantes e o que mais urge pra todo ser humano, em qualquer canto do mundo, suspirar e dizer:  GRACIAS A LA VIDA.

In: Cacos para um Vitral, pp. 86-87

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