Moro no ventre da noite:
sou a jamais nascida.
E a cada instante aguardo vida.
As estrelas, mais o negrume
são minhas faixas tutelares,
e as areias e o sal dos mares.
Ser tão completa e estar tão longe!
Sem nome e sem família cresço,
e sem rosto me reconheço.
Profunda é a noite onde moro.
Dá no que tanto se procura.
Mas intransitável, e escura.
Estarei um tempo divino
como árvore em quieta semente,
dobrada na noite, e dormente.
Até que de algum lado venha
a anunciação do meu segredo
desentranhar-me deste enredo,
arrancar-me à vagueza imensa,
consolar-me deste abandono,
mudar-me a posição do sono.
Ah, causador dos meus olhos,
que paisagem cria ou pensa
para mim, a noite densa?
(Mar Absoluto e outros poemas)
PRELÚDIO
Que tempo seria,
ó sangue, ó flor,
em que se amaria
de amor.
Pérolas de espuma,
de espuma e sal.
Nunca mais nenhuma
igual.
Era mar e lua:
minha voz, mar.
Mas a tua. . . a tua,
— luar!
Coroa divina
que a própria luz
nunca mais tão fina
produz.
Que tempo seria,
ó sangue, ó flor,
em que se amaria
de amor!
(Mar Absoluto e outros poemas)
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