domingo, 21 de outubro de 2012

Flávia Ferraz


COMPASSO DE ESPERA
Estou em compasso de espera. Não chegou a hora de eu tocar o prato, nem de fazer soar os tímpanos, no gran finale da obra. Conto os compassos e espero. Estou atenta à partitura assim como o maestro, que acompanha as partes de vários instrumentos, para fazê-los soar como um todo que faz sentido. Mas estou confusa. Leio duas partituras diferentes e as partes não se encaixam: uma é canção da partida e outra, valsa de boas vindas.

Na valsa tudo é leve. O acento, o apoio, o tempo “um” do compasso parece apenas preparação para a desinência dos tempos “dois” e “três”, suspensos, no ar. A dança está implícita, é um balanço. Para cá, para lá, para cá, para lá. É uma criança que acaba de chegar, para embalar as expectativas dos pais, preencher seus sonhos, colorir sua vida.

Já na canção, o andamento é lento. Cheia de pausas pesadas, sentidas. Não danço, apenas espero. Até o ar fica mais denso quando ela soa... É um amigo que vai partir, deixando um vazio, uma falta sem nexo, um descontínuo. Acho que perdi uma página da obra ou o compositor errou. Onde está a cadência perfeita? Ele é tão jovem, havia tanto por vir!

Oh, Pai! Por que é tão fraca a lente que usamos, que não nos deixa ler a música que ressoa dessa sobreposição? Não entendo sua harmonia, sua polirritmia. Por que parece que os tempos não casam, que a valsa se precipita alegre e tanto se arrasta o sofrimento da canção? Ou será que a canção é que correu, minando um tempo que devia se prolongar e a valsa vem infinita, numa fermata cheia de abertura para o novo?

Quando soarem os tímpanos no fim dessa obra, quero crer que a valsa e a canção fazem parte de uma mesma sinfonia. Sublime! Bela!

Uma chega para o desafio da vida. O outro salta em direção à plenitude!

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