Ó noite, ensina-me
o teu magno
segredo:
iluminar da sombra.
Da sombra permitir
a visão mais profunda.
Projeta pela sombra
o roteiro dos astros.
Quanto mais te recolhes,
ó noite, nos teus véus,
tanto mais fulgem
as constelações.
Serás acaso humilde,
generosa,
ou apenas criadora
de beleza?
Ó noite, ensina-me
o teu magno
segredo.
O IRREVELADO
Eis o trigo. Poucas
porém decisivas palavras
bastam para transmudá-lo
no corpo e sangue do Esperado.
Trigo incorrupto na infecundidade,
eis a matéria à espreita
de algo que lhe dera estrutura, de algo
que a modelara, dócil, à força.
ARIEL
Dança Ariel sob raios de sol
entre o vergel, vergando
as finas hastes, as corolas
repletas de orvalho. A gota
de orvalho, que clara
medalha sobre o peito de Ariel!
Dança Ariel renascido
de frias ruínas, como o arco-íris
do fundo dos vales. E o vento
com suas flautas e bronzes, que impulso
para os aéreos movimentos de Ariel!
Dança Ariel sobre as ondas. Seus pés
como pérolas salvas pendem
de dois frisos. E o mar,
que voluptuoso ninho de conchas
para o jogo de Ariel!
Dança Ariel sobre o altar das noites,
despertando as estrelas. E elas
próprias, suspensas
de secretos transportes, que ardentes
comparsas para o sacrifício de Ariel!
Dança Ariel para o tempo, à margem
da eternidade. E que precária
cousa, a eternidade,
para a alegria pura de Ariel!
(Azul Profundo)
Henriqueta Lisboa, Obras Completas, Vol. I, Poesia Geral, São Paulo, Duas Cidades, 1985, pp. 245-247.
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