quarta-feira, 27 de março de 2013

António Ramos Rosa

UMA NOVA INTERPRETAÇÃO DO MITO DE NARCISO 

Quero aconchegar-me nos meus braços nocturnos
sou o meu próprio berço maternal e musical
inteiramente prolongando-se redondo
como um cavalo de veias nuas 
numa vagarosa torrente cálida
no radioso tremor do meu corpo nascente
pertenço-me numa onda que vai morrendo
numa ilha numa nuvem numa teia tecendo-me
pela minha língua pelas minhas mãos pela saliva
do meu sol embriagado
pelo sabor do meu corpo que se dilata como um fruto branco
como um rio que enrola e desenrola numa contínua onda
sou o que só a si se pertence e de um útero verde desponta
numa fuga amorosa
sou Narciso aquele a que se dá esse nome puro
de flor e adolescente de solidão amada
no berço da sua extasiada fonte
e me pertenço na dádiva de me dar
o que vem do fundo de um sim de um princípio divino
e é uma mulher na sua origem de irmã incestuosa
de virgem pródiga na primitiva nudez de Eva.




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