"Escreve ambição. Aquilo que me sai para o papel deve ser imediatamente perfeito, não me contento com banalidades. Também não estou convencida dos meus dotes, essa sensação ainda não se me tornou orgânica. Em momentos extáticos acho-me capaz de operar milagres, para depois bater no fundo do poço da incerteza. Isso advém de eu não fazer diariamente aquilo que acho ser o meu talento: a escrita. Teoricamente há muito que o sei; há uns anos, escrevi num pedaço de papel: nas raras vezes em que aparece, a mercê deve ser acolhida por uma técnica bem cultivada. Mas esta foi uma frase saída do cérebro, que ainda não tomou corpo. Será que realmente vai começar uma nova fase na minha vida? Este ponto de interrogação já está errado. Inicia-se uma nova fase! A luta já está a ser travada. Luta não é exatamente a palavra certa para o momento atual presentemente sinto-me tão bem e em harmonia por dentro, tão completamente saudável, melhor é dizer pois: a consciencialização está em pleno progresso e tudo o que até agora tem estado irrepreensivelmente ordenado em fórmulas teoréticas há-de instalar-se no coração e ser concretizado. E em seguida a minha considerável autoconsciência deve ser banida — de momento ainda gosto demasiado da fase de transição. Tudo se deve tornar mais óbvio e mais simples, e assim talvez me torne finalmente adulta, capaz de ajudar outros seres humanos em dificuldades que partilham neste mundo, alcançando a claridade através do trabalho com os outros, porque afinal de contas é disso que se trata".
In Diário 1941- 1943, Assírio & Alvim: Lisboa, 2009, p. 68
domingo, 3 de março de 2013
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