POEMA
Sei bem o que fazer
mas me parece cedo.
Partir com um navio pelo mar roxo e verde
correr dentro do
bojo do navio, esse peixe,
curtir a pele dos meus dias com muitas tempestades
e
um dia — doce dia — desembarcar num cais.
Sei bem o que fazer
quando desembarcada.
Buscar por qualquer meio chegar a uma cidade
depois, por uma
estrada, ir até um grande vale,
e ali olhando a terra e os homens com suas
barbas
esquecer o que fui, beber café, e largar-me.
Sei bem o que fazer
não me surpreende nada.
Encontrar as pessoas que são novas e velhas
e comer um
punhado de cerejas com elas.
Tomar cerveja ao sol, pensar no avô e no resto
quando a
cidade era suave — quase campo —
e os delicados lírios floriam na primavera...
Sei bem o que fazer:
visitar essa terra...
Amar o amor moreno que se desdobra e arde,
afagar uns
cabelos escuros e pesados,
dormir no fim da rua no desvão de uma casa
tendo ao
meu lado um corpo forte que eu abrace
e que se agarre a mim com força, que me
beije
como eu tenho beijado as palavras e as frases...
Sei bem o que fazer;
mas me parece tarde...
[In: Obra Poética, São Paulo, Editora Hucitec, 1995, p. 149]
Modigliani |
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