acordo atravessado ao lado de ninguém sem saber o dia o que
é o jantar e digo bom dia ao estranho que se corta a fazer a barba dedilho um
até já e não há água oxigenada, falta-me a raquel o urso as fraldas o cheiro do
talco o passeio na areia o carro com estrelitas de chocolate o choro da noite,
e choro, porque é tudo novo. tudo frio. deitei fora a aliança, estou só.
visto-me a correr, tenho uma reunião, trago o coração à vista, invisto num
piano. Mozart fica bem no meu peito lacrimoso, vou a enterrar, escrevo um verso
sem sentido, sentido, penso na geometria absurda dos meus telhados infantis,
saudades do vento, sou arquitecto de um abismo que não domino, solteiro de
novo. e não sei o que faço sábado à tarde. estou perdido, lanço-me ao rio. é a
ana a paula a helena, estou magro aos pedaços aos saltos, devoro os jornais,
descasco laranjas, amargo-me. pronto, ele aí está. um divórcio delgado preso
por fitas de cetim, tu ficas com os móveis eu levo os discos tu guardas o
sorriso eu aparo o corpo, levo a carne, deixo-te o verbo, liberto-te de nós.
prendi a sombra.
perdi o passado, sou um fogo sem lume. e ardo. despojada.
perdi o passado, sou um fogo sem lume. e ardo. despojada.
In As Lágrimas Estão Todas Na Garganta do Mar, Lisboa: Arcádia, 2010, pp. 322.
Paula Rego |
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