ROMÂNICO II
Sozinho na grande abadia
o santo seco e exato
como uma pedra no alto
do monte que ali havia.
Pedra que alguém depois tomou
na sua mão
curiosa e cálida
dizendo: que esta pedra fale.
E ano após ano, num diálogo,
foi recortando e
destruindo
o que era a mais e não era santo,
o que não era paixão e sangue.
Até que deixou o osso da pedra,
o corpo seco
que ali já havia,
o santo, com seus
olhos de pranto,
com sua cara camadas de lágrimas,
sozinho e seco na grande
abadia
a chorar por mim,
por tudo o que há,
por
tudo o que houver, pelo que não se diz,
a chorar por nós, pelo que Deus não
sabe,
por aquilo que Deus não choraria.
Pela blasfêmia e pela igreja,
pelo frio e pela covardia,
pelas mãos trêmulas de quem o busca
e pelos que jamais o buscariam.
A chorar como chorou há muito
quando ainda era
pedra a sua cara triste
e sobre a pedra a ira de Deus
chovia.
[In Obra Poética, São Paulo, Editora Hucitec, 1995, p. 161]
Nenhum comentário:
Postar um comentário