Um amigo meu defende a ideia de que o suicídio, pelo fato de ser uma decisão radical, paradoxalmente, no fundo é mais fácil, um gesto, e pronto. Bem mais difícil é o silêncio. Este pressupõe paciência, constância, teimosia; e sobretudo, se confronta com o dia-a-dia da nossa vida, os dias que nos restam, um depois do outro, realmente longos com as suas pequenas horas, é como uma promessa, é de vidro, pode quebrar-se com um nada, e o seu inimigo é o tempo. Como vão as coisas. E o que as guia: um nada. Foi por acaso. Entrei no corredor daquela taberna por simples curiosidade, para olhar. A sala era sóbria, com cadeiras de palha amontoadas umas sobre as outras, e as mesas colocadas num canto. Havia fotografias nas paredes e comecei a olhá-las. Naquele vilarejo veneram duas pessoas: uma é Venizelos, porque nasceu por aqueles lados e ali teve o seu quartel-general durante as batalhas; e vê-se em retratos de quando era jovem e jornais amarelecidos que representam em cor sépia o seu amor pelo povo. O outro é Kazantzakis, porque parou neste vilarejo quando uma das suas muitas infelicidades o perseguia, e aqui o acolheram. É um escritor de que nunca gostei muito, talvez porque nos parecemos na soberba, só que nos micromeandros do nosso ser os caminhos da soberba são mais infinitos que os caminhos do Senhor, e no seu caso a soberba escolheu o caminho da coragem e do orgulho de tê-la. O meu é um caso totalmente diferente, como você bem sabe, é quando o orgulho pode optar pela covardia. Além do seu retrato, vestido de homem de bem (paletó, gravata, bigode bem cuidado, brilhantina, olhar profundo de quem está olhando a máquina fotográfica como se olhasse nos olhos a Verdade), havia também a fotografia do seu túmulo (se assim o podemos chamar), porque a sua Igreja não acolheu no cemitério um homem que lhe parecia blasfemo, e a sua cidade, Herakleion, enterrou os despojos na muralha que a circunda, e escreveu na lápide uma frase sua que o retrata fielmente, da cabeça aos pés: “Não acredito em nada. Não espero nada. Sou livre.” Veja como vão as coisas, e o que as guia, basta uma frase assim para destruir o propósito de uma pessoa como eu. O silêncio é mesmo frágil.
SOBRE ANTONIO TABUCCHI
Mikko Lagerstedt
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