quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Ruy Cinatti

OS PELA SEGUNDA VEZ NASCIDOS
Não dos mortos a coroa dos mártires,
o epitáfio em mármore esculpido,
mas dos vivos que, ressuscitados,
foram de novo mortalmente feridos.
Desses eu canto a beleza extrema,
a noite elástica de tantos relâmpagos
caindo a fundo, como num crepúsculo
de faces pálidas, corpos moribundos.
O que procuro, o que neles descubro
é a visão do mundo a que assistiram
no espaço-tempo de entre ir e vir
e o regresso ao desconhecido.
O que procuro — algumas palavras
que me revelem o prodigioso
mistério aberto entre duas almas,
antes que seja tarde e a noite avance,
a morte vença de uma vez para sempre
e deles não fique senão o vislumbre.

[In 56 Poemas, Lisboa: Relógio D´Água, 1992, p. 88].

Photo by Brian Graves

Nenhum comentário:

Rosa Alice Branco

  A Árvore da Sombra A árvore da sombra tem as folhas nuas como a própria árvore ao meio-dia quando se finca à terra e espera co...