Detesto o som do telefone
Quando não há ninguém do outro lado.
“Quem é?” Ninguém responde: silêncio.
Silêncio e um som distante, como um gemido.
Quem foi que ligou mas, de repente, decidiu não falar,
Por medo, escudado nas quatro paredes de seu quarto?
Meu amigo distante,
meu verdadeiro e tão desejado amigo,
Será você? Fale comigo!
Estamos divididos por uma dor comum,
Unidos por uma única tristeza sem palavras,
Mas, nessa mudez, falemos um com o outro.
Não podemos, não devemos ficar em silêncio!
Mas talvez seja o meu antigo inimigo
Querendo saber se estou em casa ou não -
E que, ao ouvir a minha voz conhecida, ficou satisfeito,
Ficou satisfeito e um pouquinho comovido também.
Não, não posso e não quero escondê-lo:
Aberta a tudo, como o é a minha família,
Estou tão acostumada, hoje, a sair de casa
Que, ao partir, esqueço-me de me despedir.
A separação já não me assusta mais:
Sei que sou uma dentro do todo, não estou sozinha.
Mas, Senhor, como me sinto solitária, de repente,
Quando esse silêncio me sufoca!
Seja lá quem fores, amigo ou inimigo,
Estou te ouvindo! Fala! Diz alguma coisa!
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E eu te digo que não foram em vão
os anos que vivi,
nem inúteis os caminhos que percorri,
nem sem sentido tudo o que ouvi.
Não são impermeáveis ao mundo,
nem um presente imaginário dos anos,
esses meus amores que não foram em vão,
amores falsos ou doentes
com sua luz limpa, imortal,
sempre em mim,
sempre de mim.
Nunca é tarde demais para de novo
recomeçar a vida,
retomar a estrada,
para que do passado nem uma só palavra,
nem um só gemido fique destruído.
[In Poesia Soviética, seleção, tradução e notas de Lauro Machado Coelho, São Paulo, Algol, 2007, pp. 220-221]
Olga Fiódorovna Bierggólts (1910-1975), escritora russa. Tornou-se símbolo da resistência e da determinação do povo russo durante o cerco de Leningrado por seu trabalho de encorajamento à população no rádio. Suas memórias, Dias de Estrela (1959), foram transformadas em filme em 1968.
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