segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Marize Castro

AO CAIR DA NOITE
Se amo muito é porque tudo me falta. Transporto ouro, ostras, seixos, salivas, ânforas. O gozo dos leopardos leva-me para arriscados córregos. Lá, moças uivam, rapazes flamejam; cavalos voam; hóstias e granizos soltam-se de rochas perdidas. Ouço uma canção de ninar; sou eu quando criança, brincando com a grande baleia que me visitava quando o oceano enfurecia-se e os homens extraviam-se. Minhas guelras, ainda secretas, foram retiradas ao cair da noite. Tornei-me senhora de penhascos. De onde estou, ouço o choro do sol: neblinas exultam; amantes despedem se; crisálidas desnudam-se; pétalas caem — lentamente — sobre frágil mármore.
[In Esperado Ouro, Natal, RN: UNA, 2005, p. 111]

INTEIRA
Iluminada por oráculos
alimento anjos com asas quebradas.

Não é de vendaval que eu preciso
mas da língua do amor guardada à beira-mar.

Não entendo de círios
mas de verões e sargaços bailarinos.

Acolhida pela província,
arrisco-me a enlaçar orquídeas em árvores.

Sempre sofri.
Sempre tive febre.
Sempre estive inteira em todos os infernos
Nunca quis ser abandonada.
Mas aprendi a perder.

O naufrágio me ensinou a ternura dos afogados.

[In Esperado Ouro,  Natal, RN: UNA,  2005, p. 99]


Hiram Pascal - Pinterest

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