Se amo muito é porque tudo me falta. Transporto ouro, ostras, seixos, salivas, ânforas. O gozo dos leopardos leva-me para arriscados córregos. Lá, moças uivam, rapazes flamejam; cavalos voam; hóstias e granizos soltam-se de rochas perdidas. Ouço uma canção de ninar; sou eu quando criança, brincando com a grande baleia que me visitava quando o oceano enfurecia-se e os homens extraviam-se. Minhas guelras, ainda secretas, foram retiradas ao cair da noite. Tornei-me senhora de penhascos. De onde estou, ouço o choro do sol: neblinas exultam; amantes despedem se; crisálidas desnudam-se; pétalas caem — lentamente — sobre frágil mármore.
[In Esperado Ouro, Natal, RN: UNA, 2005, p. 111]INTEIRA
Iluminada por oráculos
alimento anjos com asas quebradas.
Não é de vendaval que eu preciso
mas da língua do amor guardada à beira-mar.
Não entendo de círios
mas de verões e sargaços bailarinos.
Acolhida pela província,
arrisco-me a enlaçar orquídeas em árvores.
Sempre sofri.
Sempre tive febre.
Sempre estive inteira em todos os infernos
Nunca quis ser abandonada.
Mas aprendi a perder.
O naufrágio me ensinou a ternura dos afogados.
[In Esperado Ouro, Natal, RN: UNA, 2005, p. 99]
Hiram Pascal - Pinterest
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