No Monte Athos, um monge pegou minha mão para, disse ele, ler a minha sorte; realmente, seu rosto era de um cigano, preto, redondo, grossos lábios de bode e olhos que lançavam chamas.
— Não acredito em magia - disse-lhe rindo.
— Não faz mal, eu acredito e isso chega.
Olhou as linhas de minha mão, suas estrelas, suas cruzes, suas linhas.
— Não se meta, - disse depois de estudá-la bem - não se meta onde não é chamado; você não foi feito para a ação, fique longe; você não pode lutar com os homens; enquanto luta, vai sempre pensar que seu inimigo pode ter razão e, mesmo que não goste dele, vai sempre perdoá-lo. Entendeu?
— Continue! - disse-lhe porque estava meio perturbado, pois, vi que esse monge, que me via pela primeira vez, tinha razão.
Observou atentamente a palma da minha mão;
— Muitas preocupações o torturam, você pede muito, pergunta muito, consome o seu coração; pelo bem que te quero, não se apresse a encontrar a resposta; não é você que tem que ir buscá-la, é ela que deve vir a você; ouça o que estou dizendo, está vindo alguma coisa muito tranquila. Ouve mais uma palavra que, um dia, o abade me disse: um monge, durante toda a sua vida, ansiava por Deus e, apenas quando estava lutando com a morte, percebeu que era Deus que ansiava por ele.
Inclinou-se de novo, sobre a minha mão, arregalou os olhos e olhou para mim:
— Você - disse - vai ser monge na velhice. Não ria, você vai ser monge.
Uma profecia mentirosa pode, num momento qualquer, se tornar verdadeira,
é só você acreditar nela. Lembrei-me da profecia da parteira no meu nascimento, olhou-me na luz e disse; “Essa criança, um dia, será bispo”. Assustei-me.
— Eu não quero - gritei, e arranquei minha mão como se sentisse cheiro do perigo.
Com a passagem do tempo, esqueci-me disso, o mesmo aconteceu com as palavras do monge que, esta noite, de repente, vieram à minha mente, quis rir, mas, não consegui; ao que parece, elas trabalhavam em silêncio durante todo esse tempo e me empurravam para onde eu não queria ir; não podia mais rir.
Fechei os olhos para que o sono viesse e me salvasse.
Eu era, dizem, um rebelde, me perseguiam pelas ruas de uma grande cidade, pegaram-me, julgaram-me, condenaram-me à morte. O carcereiro me pegou, colocou-me à sua frente, ele vinha atrás com o chicote no ombro; eu corri. “Por que você está correndo?” perguntou o carcereiro, que já estava ficando ofegante. “Estou com pressa” respondi, “estou com pressa”. E, antes que eu tivesse terminado a frase, um ventinho fresco soprou e o carcereiro desapareceu. Não era um carcereiro, era uma nuvem negra que se espalhou. Eu queria prosseguir, mas não podia; uma montanha toda de pedras agudas apareceu na minha frente e fechou o meu caminho. No cimo da montanha, tinha uma bandeira vermelha. Eu disse: “Tenho que subir para poder prosseguir em nome de Deus!”. Fiz o sinal da cruz e comecei a subir; mas, os pregos dos meus coturnos batiam nas pedras e levantava faísca. Eu subia, subia, escorregava, caía, tornava a subir. E, quando cheguei perto do pico, vi, não era uma bandeira, era um chama. Subia e tinha meus olhos fixos no pico; não, não era chama, via-o claramente agora, era Deus, mas não o Pai, o outro, o terrível Jeová, que me esperava.
O sangue me gelou nas veias; por um momento, pensei em voltar; fiquei com vergonha. “Agora,” murmurei, “já era... Continue em frente!” “Você não está com medo?” ouvi uma voz feminina dentro de mim. “Sim, tenho medo!” gritei tão alto e com tanta angústia que acordei.
[In RELATÓRIO AO GRECO, tradução direta do grego por Lucilia Soares Brandão, introdução de Carolina Dônega Bernardes, Rio de Janeiro: Cassará, 2014, p. 244].
2 comentários:
Aplausos. Pk é magnífico este excerto.
Senti me em casa. Obrigada. ♥
Tb. gosto muito! Bj
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