sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Manuel António Pina

TANTA TERRA
Tanta terra,
tantas palavras sob tantas palavras.
Regressa como um corpo o coração
à apenas existência,

lembrança de
alguma coisa lida:
o rosto da mãe, a trepadeira do jardim.
Mãe, afastei-me de mais, perdi-me

no meio de palavras minhas e palavras alheias,
quem, se eu gritar, me ouvirá entre as legiões dos anjos?
E nem isto me pertence,

a tua ausência e o meu medo;
nem estou na minha ausência,
fui como um vaso e quebrei-me ou qualquer coisa assim.

[In Nenhuma palavra e nenhuma lembrança,  In Todas as Palavras Poesia reunida, 3a. ed, Porto, Assírio & Alvim, 2013, p. 235]. 


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