domingo, 22 de julho de 2012

Carlos Pintado

TALVEZ NEM A LUZ ME SALVE
Distante da luz chamo minhas sombras.
Abraço-me à dor como quem sabe
que nenhum reino terá, além do esquecimento.                
Nada haverá senão  pegadas que outros deixam
sobre minha pegada. Distante de tudo,
nas tardes tranquilas de alguma cidade,
quem sabe alguém descobrirá meu rosto
no rosto sem vida de uma estátua.
Senti uma vez esse horror.
Sonhei a morte como sonha
uma criança em segredo com um brinquedo
muito alto para suas mãos. Abracei-me
a minha dor, a meu medo,
súbita sombra me abraçou.
Ninguém pode salvar-me da noite
nem dessas breves praias onde fomos
de certa forma o amado e o amante.
Senti a misteriosa espuma subindo-me
de alto a baixo, toda a friagem
da água, suas facas a devorar,
a arder nas trevas das águas.
Nada pode salvar-me dessa espuma, 
de seus cisnes de morte percorrendo-me.
Talvez já sem glória; despojado
de toda luz e brilho, silencioso
como um homem ciente de sua morte, 
recorro às paragens onde deixei
minha sombra a beber tua sombra
para depois sentar-me e ver tranquilo
como constroem torres em meu nome
como  ninguém escuta quando digo
sou mínimo, sou mínimo, e confesso
sou eu quem toca, às vezes, serenamente,
o coração insondável dos homens.
Tradução livre autorizada pelo autor, por Antonio Damásio Rego Filho

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