DIVISO AO LONGE
Do mastro diviso ao longe
Proteu e Tristão fantásticos
trabalhando sobre as ondas
em movimentos e ruídos cornucópicos
a colorir o som dos peixes
que resolutos continuam
sua antiquíssima navegação
por mares e cardumes
que tão longe vão
que chegam a alcançar
as costas da minha nostalgia.
Costas fortes e lustrosas
pelas quais deslizam
em meu
delírio
cabelos de cobre raios de luar
e incrustados rostos navegantes
painel que o mar pintou em
suas falésias.
Outros rostos a esses se juntaram
negros vermelhos amarelos
pardos
emigrantes do sal dos mares
coincidência coletiva a nos formar
nós, os
brasileiros.
Do alto dos rochedos
esse Brasil me acena gritando
saudades
amores
ensolarados orixás
bancarrotas financeiras
convulsões abraçadas
a surtos
e moratórias cordiais
e paticumbuns nacionais.
O grande hospício da América Latina me chama.
Será que eu serei o dono desta festa?
Um prazer incomensurável move a nossa loucura
o mesmo prazer testemunhado
em livro do Tombo
esguia torre de pombos
a reservar o segredo
de uma gente recém-criada
ainda fresca de barro
nua e tão contente.
Deslumbrada.
As marinhas (1984)
DO AMOR
Acordo quando falas
e nunca sei o que quero ouvir.
Sei que falas e isso basta
porque esta hora é feliz.
E desejo outras e mais outras
em que dirás tudo o que quero ouvir.
Saudades futuras,
A teu lado caminho quase muda
e estando contente
nunca estou feliz.
*
Não pude ser
o teu amor perfeito
antes esta ferida.
Tudo é sempre agora (1994)
In: Roteiro da Poesia Brasileira - anos 60, seleção e prefácio Pedro Lyra, São Paulo: Global, 2011, pp. 111-113
Paulista, radicada no Rio de Janeiro, Neide Archanjo é formada em Direito e
Psicologia. Estreou na poesia em 1964, com o livro Primeiros Ofícios
da Memória. Desde então criou e participou de movimentos como
"Poesia na Praça", varais de poesia, espetáculos em teatros, cafés,
faculdades, bibliotecas, festivais nacionais e internacionais de
poesia e arte. Criou e implantou a Oficina Literária da Biblioteca
Mário de Andrade, em São Paulo. Foi bolsista da Fundação Calouste
Gulbenkian na qualidade de poeta residente, em Portugal. Seus poemas
figuram em antologias nacionais e estrangeiras. É considerada pela
critica como uma das autoras mais significativas da geração que
surgiu na literatura brasileira na década de 60. Em 1980 recebeu o
prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Arte ( APCA) de
Poesia. Em 1995 foi indicada para o Prêmio Jabuti, de poesia com o
livro Tudo e Sempre Agora. Atualmente é assessora da Fundação
Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro.
A obra:
A obra:
-
Primeiros Ofícios da Memória - ed. Massao Ohno - SP., 1964.
-
O Poeta Itinerante - ed. I.L.A.Palma - SP., 1968.
-
Poesia na Praça - ed. I.L.A.Palma - S.P., 1970.
-
Quixote Tango e Foxtrote - ed. do Escritor - SP., 1975.
-
Escavações - ed. Nova Fronteira - RJ., 1980.
-
As Marinhas - ed. Salamandra - RJ., 1984.
-
Poesia 1964 a 1984 -Antologia - ed. Guanabara, 1987.
-
Tudo é sempre Agora - ed. Maltese - SP., 1995.
-
Pequeno Oratório do Poeta Para o Anjo - Ed. do Autor - SP., 1997
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