XXIII
Essa lua enlutada, esse desassossego
A convulsão de dentro, ilharga
Dentro da solidão, corpo morrendo
Tudo isso te devo. E eram tão vastas
As coisas planejadas: navios,
Muralhas de marfim, palavras largas
Consentimento sempre. E seria dezembro.
Um cavalo de jade sob as águas
Dupla transparência, fio suspenso
Todas essas coisas na ponta dos teus dedos
E tudo se desfez no pórtico do tempo
Em lívido silêncio. Umas manhãs de vidro
Vento, a alma esvaziada, um sol que não vejo
Também isso te devo.
XXIV
Ai, que distanciamento, que montanha, que água
Estes rios
fundos, o meu sumo escorrendo,
Esta chaga, ai, senhor, que já não vejo
O tempo, ando
ensombrada
Quase dormida e insone pela casa
E ao mesmo tempo raposa perseguida:
Se ontem ousava correr, hoje não ousa.
Antes se alegra
Do ouvido que escuta os cavalos correndo
A música dos
instrumentos, dos cães o latido
E se deixa matar. Ai de mim, me conhecendo
Penitente sem ser preciso, com esse viço do amor.
Não me sabendo nunca
perseguida
Mas sendo caça, indo à frente
E perseguindo o caçador.
(Do Amor, Massao Ohno Editor: São Paulo, 1999, pp. 32-33)
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