ELES SE VÃO
Eles se vão, os olhos no infinito,
a alma em vigília, o tíbio pensamento
suspenso no ar como um emblema e um grito.
Eles se vão, eles se vão. As mãos
são flâmulas em fluido movimento
à procura de duendes e de irmãos.
Eles se vão, esguios bailarinos
que dançam entre as vértebras do vento
ao som arcaico de órficos violinos.
Sortilégios, ambíguos e secretos,
trazem na fronte o alfanje do tormento
e são-lhe os passos pássaros inquietos.
Nenhum palmo de terra os enraíza,
nem lhes concede gozo ou sofrimento,
e o efêmero em seu visgo os eterniza.
Nada os detém, nem rogos nem promessas,
e os dois extremos, morte e nascimento,
lhes sabem como imagens às avessas.
Cristais de um brilho esfíngico e assassino
ofuscam-lhes o rosto sonolento
quando os acorda o fel do sol a pino.
E a tarde escorre lenta como um rio
que os banha no torpor do esquecimento
ou de algo mais espesso e mais sombrio.
De si não deixam mais do que um indício,
como se à luz de um vago testamento
o fim lhes desse o frêmito do início.
Eles se vão. O céu não lhes responde
e o inferno não lhes ouve um só lamento.
Eles se vão. Mas para onde?
Ivan Junqueira. Poemas Reunidos, São Paulo:Record, 1999, p. 241
sábado, 15 de dezembro de 2012
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