A RAINER MARIA RILKE
Minha tua pele pálida
e as pálpebras de entumecidas pétalas.
De castanhas em azuis, estas pupilas.
Amo as mulheres que adoraste,
Anjo inconstante, ou Criança
alcançando-lhes o joelho:
Lou e Paula Modersohn e Clara
Benvenuta ao piano
a Princesa
esbelta e sardenta
e o estranho Pasha.
Instável pássaro do amor,
de polainas cinzentas, tão feias e aristocráticas.
Teu chapéu e bengala usei
no vergel friorento de Muzot.
Entramos com o vento na grande sala hipóstila,
ou encravado
na Catedral o eterno ponteiro sou
do Anjo do Meio-Dia. Perambulo por todos os
jardins,
corro atrás de epiléticos e saltimbancos de subúrbio,
dou a rosa à
mendiga enquanto adere ao meu rosto
o pegajoso escárnio. E as escadas...
subo-as todas.
Entro no quarto rue Toulier e enlouqueço
nos crisântemos sobre a
mesa.
Teu passo anda em meus pés e não os esquivo.
Abismo, abismo de tua pupila azul!
Nela tudo vejo do que viste em Firenze, Rússia e
[Toledo,
debruço-me sobre a ponte e deixo cair o lenço:
a
Desconhecida assim o pediu...
Esta manhã trouxe-nos a morte.
Sou viva em ti e morta e novamente viva,
morro em teu leito
com tuas feridas,
tua angústia refletida em meus olhos azuis.
Nesta manhã de
inverno desfaço-me contigo,
para que do nada crie-nos Deus.
(Talhamar, 1982)
[In Poesia Reunida, Rio de Janeiro, Ed. Topbooks, 1999, pp. 260-261]
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