para além
dos bancos de areia prateada
para além dos bancos de areia prateada
cobertos por um capim
rasteiro e triste
está o mar da república oriental
feito de gelo e tardes
desertas
saudoso de seus generais e caudilhos
amnesiado dos corpos
que ali entraram
no verão
à espera de um sol que fosse mais
que a mera decoração dos souvenirs
e
das caixas de alfajor da zona franca
dentro do carro ouvimos o vento -
éolo perdido no fim do
mundo
batendo nos vidros com a insistência
anacrônica de um caixeiro viajante
apertamos nossas mãos
e eu vejo a mancha de sangue
entre
tuas coxas
alastrando-se muito devagar
mais um mês que estamos juntos,
no rádio uma velha canção
promete em inglês sulista
os encantos do amor eterno
olhamos ao mesmo tempo através do vidro
pequenas gotas de
maresia cintilam
como pedras não lapidadas,
um sorriso se forma em teus lábios
a visão de súbito se me liquefaz
e então um locutor (talvez eu mesmo)
diz entre soturno e
zombeteiro:
señor, não se chega impunemente ao trigésimo quinto inverno
In A última temporada, Porto Alegre: Ed. Ardotempo, pp. 35-36
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