quarta-feira, 17 de julho de 2013

Else Lasker-Schüler

DAVID E JÔNATAS*
Na Bíblia estamos escritos 
Num abraço de cores vivas.

Mas os nossos jogos de meninos estão 
Vivos também na nossa estrela.

Eu sou David,
Tu, o meu companheiro de brinquedos.

Ah, os dois tingíamos de vermelho 
Os nossos corações brancos de carneiro!

Como as flores em botão nos salmos do amor 
Sob o céu de um dia de festa.

Mas os teus olhos de despedida, os teus olhos — 
Estás sempre a despedir-te no silêncio do beijo.

E o teu coração, que fará 
Ainda sem o meu?

A tua noite doce 
Sem as minhas canções?

* I Samuel, 18.

[In Baladas Hebraicas, tradução e apresentação de João Barrento, Lisboa: Assírio & Alvim, 2002, p. 69].

NO PRINCÍPIO
Suspensa de uma nuvem de ouro de primavera, 
Quando o mundo era ainda uma criança 
E Deus ainda tão jovem, e já pai.
Baloiçava, e ai!
Pelo éter ela vai,
Os cabelos de lã brilhando em rodopio.
Brincava com o trôpego avô-sol,
Depenicava prata da mãe-lua,
Tranquei Satanás lá no céu 
E Deus no inferno fumegante.
E eles ameaçavam-me com o dedo maior,
E davam murros na porta: Bum, bum!
E as chicotadas dos ventos sibilavam;
Mas depois Deus, com o diabo, deu duas gargalhadas 
Trovejantes, rindo do meu pecado mortal.
Daria a 10000 na terra felicidade 
Para voltar a viver nascida assim de Deus,
Assim a salvo em Deus, assim sem véus.
Assim,
Como quando era ainda a menina traquinas de Deus!

[In Baladas Hebraicas, tradução e apresentação de João Barrento, Lisboa: Assírio & Alvim, 2002, p. 91].




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