Excerto de "A hora dos Assassinos"
Os signos e símbolos que o
poeta usa constituem uma das provas mais seguras de que a linguagem é um meio
de lidar com o inexprimível e o insondável. Assim que se tornam compreensíveis em todos os níveis, os símbolos perdem
validade e eficácia. Pedir ao poeta que fale a linguagem do homem da rua é como
esperar que o profeta esclareça seus vaticínios. Aquilo que nos fala de
esferas superiores, mais distantes, vem envolto em segredo e mistério. O que é
constantemente expandido e elaborado pela explicação - em suma, pelo mundo
conceitual - está ao mesmo tempo sendo comprimido, sintetizado, pela caligrafia
estenográfica dos símbolos. Nós nunca podemos explicar, a não ser em termos
de novos enigmas. O que pertence ao domínio do espírito, ou do eterno, escapa a
qualquer explicação. A linguagem do poeta é assintótica; corre paralela à voz
interior quando essa se aproxima da eternidade do espírito. É através desse
registro interior que o homem sem linguagem, por assim dizer, entra em
comunicação com o poeta. Não se cogita aqui de educação verbal, mas de
desenvolvimento espiritual. Nada deixa mais evidente a pureza de Rimbaud que esse diapasão intransigente que
manteve em toda a sua obra. Ele é compreendido pelos tipos mais diversos e também
se presta aos maiores equívocos. Seus imitadores podem ser detectados
imediatamente. Nada tem em comum com a escola dos simbolistas. Nem com os
surrealistas, pelo menos a meu ver. E pai de várias escolas, sem ter criado
nenhuma. O atestado de seu gênio reside no uso extraordinário do símbolo.
Simbologia moldada em sangue e angústia. Simultaneamente protesto e
tergiversação da desoladora difusão de conhecimentos que ameaçava sufocar a fonte do espírito. E
também janela que se abria para um mundo de relações infinitamente mais complexas
para as quais a velha linguagem de signos não mais servia.
[In A hora dos Assassinos (Um estudo sobre Rimbaud), Tradução de Milton Persson, Porto Alegre, L&PM Pocket, 2010, p. 46]
MURAT |
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