Eclesiastes,
1,9
Se passo a mão de leve sobre a fronte,
se afago as lombadas
desses livros,
se o Livro das Noites reconheço,
se giro a terceira fechadura,
se me demoro no umbral incerto,
se uma dor incrível me atordoa,
se recordo a Máquina do Tempo,
se recordo o tapete do
unicórnio,
se mudo a posição enquanto durmo,
se a memória me devolve
um verso,
repito o ritual inumeráveis
vezes em meu assinalado rumo.
Não posso executar um ato novo,
teço e torno a tecer a mesma
fábula,
repito um repetido decassílabo,
torno a dizer o que outros me disseram,
as mesmas coisas sinto, sempre à mesma
hora do dia ou
da abstrata noite.
Noite após noite o mesmo pesadelo,
noite após noite o
austero labirinto.
Sou o cansaço de um espelho imóvel
ou o pó de um museu.
Somente algo indesejado espero,
só espero esse dom, ouro da sombra,
essa virgem, a morte. (O
castelhano
permite esta metáfora.)
Poesia Borges, Companhia das Letras, 2009, p. 310-311
Kyung Hoon Min |
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