sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Stéphane Mallarmé

BRISA MARINHA
Triste carne, ai de mim! Já li os livros todos.
Fugir! Longe fugir! As aves sinto a modos 
De ser ébrias de espuma entre o mistério e os céus! 
Nada, nem os jardins espelhados nos meus 
Olhos, o coração retém quase afogado,
Ó noites! nem da lâmpada a ausente claridade 
No branco do papel que o vazio rejeita 
E nem a jovem mãe que ao peito o filho aleita. 
Hei-de partir! Veleiro a mastrear, tu, larga 
As amarras, demanda outra exótica plaga!
Um Tédio, desolado por esperanças cruéis,
Crê ainda nos lenços molhados dos adeus!
E talvez que esses mastros atraindo os presságios 
Sejam dos que o tufão verga sobre os naufrágios 
Perdidos, já sem mastros, em estéreis ilhéus...
Mas os marujos cantam, ouve, coração meu!

SANTA
À janela onde se recolhe 
O sândalo velho e já gasto 
Da viola que muito outrora 
Brilhara, com mandolina ou flauta,

Está a Santa pálida, que mostra 
O livro velho desfolhado 
Do Magnificat, outrora esparso, 
na prece vesperal:

A essa vidraça de custódia 
Que rasa uma harpa formada 
Pelo Anjo em seu noturno voo 
Para a falange delicada

Do dedo que, sem o velho sândalo 
Nem o velho livro, ela estende 
Sobre a instrumental plumagem, 
Na música só do silêncio.

Sobre Stéphane Mallarmé

In Sthéphane Mallarmé - Poemas lidos por Fernando Pessoa, tradução e prefácio José Augusto Seabra, Lisboa, Assírio & Alvim, 1998, pp. 56-57.


MATISSE

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