domingo, 13 de outubro de 2013

W. H. Auden

ACALANTO
Pousa, amor, a cabeça sonolenta,
Humana sobre o meu braço inconstante;
A beleza das crianças pensativas 
Tempo e febres consomem lentamente 
E cabe à tumba mostrar quão efêmeras 
Essas mesmas crianças vêm a ser:
Mas que em meu braço, até que nasça o dia, 
Possa repousar a viva criatura,
Mortal e culpada, e, no entanto, para 
Mim a coisa mais bela de se ver.

Nem a alma nem o corpo têm amarras:
Para os amantes, quando eles se deitam 
No seu declive indulgente e encantado, 
Tomados da languidez costumeira,
Intensa é a visão que Vênus manda 
De uma simpatia sobrenatural,
De esperança e amor generalizado; 
Enquanto uma abstrata intuição desperta, 
No meio das geleiras e das pedras,
Do eremita o êxtase carnal.

Certeza e fidelidade se estiolam 
Quando bate meia-noite o relógio 
Como se fossem vibrações de um sino,
E lançam seu pedante palavrório,
Aos gritos, os delirantes em voga:
Os últimos centavos a pagar — 
Assim o prevê o baralho mofino —
Serão saldados; porém, desta noite,
Que não se perca nenhum pensamento, 
Nenhum suspiro, nenhum beijo ou olhar.

A beleza, a meia-noite e a visão morrem: 
Deixa os ventos do amanhecer, que sopram 
Suaves em tua sonhadora cabeça,
Exibirem um dia de tal forma
Propício que o olho e o coração o saúdem,
Satisfeitos com o mundo mortal;
Quer a secura meridiana te veja 
Nutrida pela força involuntária 
E permita-te ir a noite adversária 
Guardada pelo amor universal.
(J. M.J.)

Sobre W. H. AUDEN 

[In Poemas, Seleção de João Moura Jr., Tradução e Introdução: José Paulo Paes e João Moura Jr., São Paulo, Companhia das Letras, 1986, pp. 45-47]

                 Rio Villegas 

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