segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Ruy Belo

O GIRASSOL DE RIO DE ONOR 
Existe juro um girassol em rio de onor 
mais importante por exemplo para mim que seja lá quem for
Eu vi hoje na andaluzia o girassol de rio de onor
à beira de uma estrada pouco antes de chegar a fernan nunez
(Amigos que passais em direcção a córdova ou aos cobres de lucena
dai-me notícias desse girassol menos brilhante sol
mas bem mais acessível pelo menos para nós que não temos raízes
mas pomos o que temos sobre a terra)
Reconheci-o logo embora há muitos anos o não visse além de o conhecer sabia ser ele natural de rio de onor e lá habitualmente residente
E ele raios o partam disse idênticas as pétalas igual a cor
é ele ó céus é ele sem tirar nem pôr
o meu amigo girassol de rio de onor
(é fácil ter na flor um verdadeiro amigo
se o não sabíeis antes desde agora que o sabeis)
Era o mesmo era ele sem tirar nem pôr o girassol de rio de onor há tantos anos visto Mas nós os que lá fomos e por lá passámos nós é que já não somos quem lá fomos
e muito menos nós que somos vivos menos os mesmos somos que tu o meu amigo com as tuas duas pernas pendentes lá da ponte sobre o rio pequena ponte e diminuto rio a dois passos dos olhos tão redondos que solares dessas duas ou três quatro no máximo crianças (meu deus essas crianças onde é hoje o seu país?)
Viajo pela espanha mas é este julgo juro o girassol pois embora não esteja em portugal
não há ainda julgo plantas nacionais
e além disso aquela terra é meio espanhola
Mas nós que assim passamos pelos campos pelos dias
nós que não temos nem nunca tivemos
coisa pequena como uns palmos de país
pomos tudo o que somos nestes seres que passamo
e nos fixamos só em certas fotografias que tiramos
Era aquele julgo juro o girassol de há anos
mas nós que como sombras por aqui passamos
porventura seremos os que éramos há anos?
Qual é ao certo o nosso verdadeiro país?
Lanço a pergunta aos verdes campos outonais da andaluzia
mas esta paisagem que tanto me diz
quem sou isso é que ela nem ninguém mo diz.


(TRANSPORTE NO TEMPO)

In Todos os Poemas, Lisboa, Assírio & Alvim, 3a. ed., 2009, pP. 448-449.




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