Nasço com as luzes mais altas, acesas no penúltimo
degrau das sombras, o corpo envolto ainda
nos braços da minha laranjeira,
derrubada na escuridão tempestuosa
da última noite de Natal.
Dela sobram pássaros, laranjas, folhas,
o vento, a chuva intensa,
e a raiz parcialmente apodrecida que a fez tombar
febrilmente sobre a minha face.
A ela me acolho, à sua seiva, ao seu fulgor,
às toalhas de chuva,
e aos muros que irromperam, há muito,
para amparar as sombras
e a face fracturada destes dias.
Os seus troncos envolvem-me suavemente
nas noites, dilatadas entre a água, o incenso,
a talha barroca e a narrativa azul do ouro
e dos presépios.
Na chama das imagens fracturadas, nasço,
escutando o rodopiar das aves moribundas,
anjos furtivos adejando,
entre laranjas, música, trompetes de chuva,
escrevendo labirintos, longas espirais,
nas horas mágicas, luminosas
de um poema para o primeiro dia.
Braga, 1 de Janeiro de 2014
Maria do Sameiro Barroso
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