terça-feira, 4 de março de 2014

Mariana Ianelli

Nada foi feito que revivesse a coisa morta,
Mas no rosto do amante solitário
Uma tarde despontou dentre milhares
E quis do homem o seu prazer intenso
De sonhar o mesmo vulto sobre a cama,
O mesmo vínculo que se estabeleceu
Para ser rompido como os que o antecederam
E os que viriam raramente depois dele.
Cindiu a indiferença dos anos e voltou
Com sua fome, seu poder ambíguo de encantar
Pela eternidade do instante que floresce
Apenas quando a melancolia de tê-lo perdido
Também volta, agora com toda a sua beleza visionária.
Uma tarde cuja manhã já se esqueceu
No traço de tantas iguais que vêm e passam
Como para só cumprir o ato necessário;
Uma tarde cuja noite se tornou algum resíduo amortalhado.
Estava ilhada, suspensa no fluxo do tempo,
Era a relíquia do amante e era o seu trauma.

[In Passagens, São Paulo: Iluminuras, 2003, p. 81]

Berthe Morisot 

 Manet à l'île de Wight

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