sexta-feira, 11 de abril de 2014

Antonio Gamoneda

CANÇÃO DO SOLITÁRIO
Harmonioso é o voo dos pássaros. Nos prados cristalinos dos cervos, os verdes bosques se encontram ao crepúsculo em torno às  cabanas silenciosas.

A escuridão torna mais tênue o murmúrio das águas. Úmidas sombras surgem

e, melodiosas no vento, também surgem  as flores do verão.

Anoitece na cabeça do homem pensativo e uma chama de bondade arde no seu coração.

Serenidade da ceia:   o pão e o vinho são abençoados pelas mãos de Deus

e, silenciosamente, teu irmão,  com seus olhos noturnos,  descansa dos caminhos espinhosos.

Ah viver no azul e no espírito da noite.

Nos quartos, o silêncio cerca de ternura a sombra dos antepassados,

os martírios avermelhados, o lamento  de uma estirpe

que, piedosa,  se extingue com o seu último descendente.

No umbral de pedra o enfermo desperta das negras horas da loucura

e lhe cercam o fresco azul, o luminoso declinar do outono,

o sossego da casa e as lendas do bosque.

Esta é  a medida e o preceito, assim são os caminhos lunares

daqueles que fogem à proximidade  da morte.

[In Esta luz, Poesía Reunida (1947-2004), Barcelona, Círculo de Lectores, S.A./ Galaxia Gutenberg, 2010, pp. 571-572].



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