De todos os vazios entre os tempos,
de todas as distâncias entre as filas de soldados,
das brechas do tapume,
das portas que fechamos mal,
das mãos que não juntamos bem,
do vazio entre os nossos corpos que não apertamos
um contra o outro —
nasce uma extensão vasta que se desdobra,
uma planície, um deserto,
por onde nossa alma irá sem esperança, depois da morte.
A MORTE DE MEU PAI
Meu pai, de repente, de todos os aposentos
partiu para suas estranhas lonjuras.
Ele partiu para chamar seu Deus
para que nos viesse ajudar agora.
E Deus já chegou, como um operário, servente
e pendurou seu casaco num prego da lua.
Mas nosso pai, que foi buscá-lo,
Deus o guardará para sempre consigo.
TUA VIDA E TUA MORTE, MEU PAI
Tua vida e tua morte, meu pai,
estão pousadas nos meus ombros.
Minha mulher nos trará
água.
Vem e bebamos, meu pai,
às minhas flores, às idéias,
pois tu me esperavas
e já não sou mais esperado agora.
Tua boca entreaberta, meu pai,
cantava e eu não ouvi.
A árvore do pátio era profeta
e eu não o soube.
Só teu passo, meu pai,
continua a caminhar no meu sangue.
Outrora foste o meu acompanhante.
Sou eu que te acompanho agora.
(Tradução: Cecília Meireles)
[In Antologia da Literatura Hebraica Moderna, Rio de Janeiro, Biblos, 1969, pp. 84-85]
Yehuda Amichai, nascido na Alemanha em 1924 e educado em Israel. Participou da Guerra da Independência e estudou a Língua Hebraica. Publicou três coleções poéticas que lhe valeram o prêmio Shlonski. Faleceu em Jerusalém no ano 2000.
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