I
apesar dos chacais, aqui estás
disposto a mais
essa aventura
(núbil
ou inútil)
em busca
do Absoluto
tu não aprendes com a dor
é teu defeito
o peito
repete o furto
e o fatigado
fígado
– casmurro ao
cárcere –
gladia com a harpia
da solidão
aqui estás
no fracasso de tudo
com frustração e furor
asco e pânico
e crises de cólera comprovam
que não és um anjo
II
héctico pulsar
de diamantes
que revigoras
quando avanças
ampla
unidade de
relâmpagos, fusão
de infâncias, cura
das pústulas espúrias, ocaso
das culpas, enlace
de exílios, riso
cúmplice, sono
unívoco
isso
esperas da Verdade
e seu milagre
pois não aprendes com a dor:
amas sempre
FLUXOS RUBROS
primeiro foi a manhã
ruiva leoa:
patas de tulipas
e rugidos de papoulas
depois o fogo
artéria de hélio
glóbulos celsius
irrigando a terra
por fim: o crepúsculo
portal de rubis
entre astros que nascem
e azuis
que desintegram
O AÇÚCAR É
fúsil
se alumens diluem
sua armadura mascava
acro
se cáustico ataque
parte a mandíbula frágil
albino
se fios de refino
esfolam aminoácidos
inviso, líquido, místico
se luz ou amor destilam
gotas etílicas de seus átomos
FONTES
estou sentado no solo do sofrimento, longe das
harpas do sexo, das quatro fases do fogo
e cavo para ver
estou sentado de costas
com as mãos ulceradas, buscando
o coração da Flor (o branco
nome dos entes)
que bate na boca
de Deus
estou como Borges:
no escuro, tateando
hipóteses da
obra, sentindo
a mitológica fala
que agarro e arrasto
para luz:
raiz
da linguagem
que o ar áudil
esfaz
ECOS
I
o verso: negra
pedra, quebra
o silêncio: vã
mordaça de
estilhaços
que o encerra
(ou exalta)
um segundo
após o impacto
II
a página:
breve
arena
(ou
tenro
tálamo)
em
que se
invadem
e
dil-atam
o vazio
e as
palavras
III
a leitura:
rubro
gesto de
audir fogo
polir ecos
em abismos
caçar febres
em contrários
- alçar aves –
RESGATE
adeus, fosso escuro
tumba de mundos
chão de tarântulas
adeus, minha ira
meu fracasso
hircus foetidum complexos
ócio pânico fantasmas
traições élan do nada
adeus
junto aos cabos do amor
e às cordas
da aurora
eu subo ao círculo azul
do recomeço
(uma face me iça)
LAUDO
cardiopata crônico
com
alto nível
de açúcar no sangue
inflamações
dissolvendo neurônios
insanidade
sonhos
displasia lírica
no dna das
células
e um
repetitivo
pendor à hipérbole
pelo que
diagnosticamos:
excesso
de um hormônio
só encontrado em anjos
ou
vulgarmente falando
AMOR
tipo
raro
sem remédio
O Bom Samaritano, 1885, Ferdinand Hodler (1853-1918 |
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