sábado, 20 de dezembro de 2014

Alberto Bresciani

MITOLOGIA

O muro não me libertará
(sei porque sou tempo)

Conhecendo também
suas entranhas, armadilhas
saliências e entraves

eu o escalo
até o alto
onde ameias são faces tantas
e arranham ou assaltam
a vida

Lá, debruço-me
pendo, estico-me
jogo as mãos
a pele

e mesmo que não encontre
matéria de igual trama
ainda tenho

céu, vento, ar
ou desejo e dúvida e ilusão

Este (é um murmúrio)
o meu plano de voo
ramo de salvação

Sim, no relume das horas
arranco uma ou outra
de suas plumas e
do cimo
sinto

o doce estrépito
de um corpo
que arde e responde
                 sob o meu.

HALO
Para Maria de Assis Calsing

Essa casa não tem janelas
não tem portas, paredes

A solidez rejeita a ameaça
mas não pesa sobre a água

Translúcido é o nome solto no ar
no perfume, nas açucenas

Leve e diáfana casa
aninha o que flutua, o que não cai

tudo nela germina e enflora
abriga sim e a tudo afirma

E nela, clara casa, não há não
caminhos se abrem

e sopram à cálida folhagem
a brisa, a carícia do lago

Sobre ela, firme e branda casa,
palavras brincam com a luz

são imagens que a alma canta
(e eu digo: alada mão as deixou).

MARGHE(RITA)

Não valem os dias
além dos corações
que neles batem
São caminhos

Essa única vista
me verte o sim
Você fala por ela
e repete as imagens

A porta que abre
verdeja
e floresce
para dentro do corpo

história maior
do que antigas lembranças

Do teu nome,
margaridas nascem sobre a lava.

[In Incompleto Movimento, Rio de Janeiro: José Olympio, 2011, pp. 24-25, 33, 64]




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