sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Cesare Pavese

A VOZ

Cada dia o silêncio do quarto isolado
se recolhe no leve marulho dos gestos
como o ar. Cada dia a estreita janela
se abre imóvel ao ar que se cala. A voz
rouca e doce não volta no fresco silêncio.

O ar imóvel se abre ao alento de quem
vai falar e se cala. É assim todo dia.
E a voz é a mesma, mas não rompe o silêncio,
rouca e igual como sempre na imobilidade
da memória. A clara janela acompanha
com sua breve batida o antigo sossego.

Cada gesto percute o antigo sossego.
Se soasse a voz, voltariam as dores.
Voltariam os gestos no ar espantado
e palavras, palavras à voz submissa.
Se essa voz ressoasse, até a breve batida
do silêncio que dura seria uma dor.

(In Trabalhar Cansa, Tradução e introdução Maurício Santana Dias, São Paulo: Cosac Naify, 2009, p. 269)



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