"... agora, é apenas meu coração que
está palpitando no mundo."
Emílio Moura
Sou uma lâmpada votiva ardendo ardendo,
murmúrios e mistérios da noite vibram em mim.
Todo o mundo em meu corpo, toda a vida:
amores e pecados, dores, morte
— uma vida ou uma lentíssima agonia?
Sinto na carne vigílias maceradas
gritos que eu grito, soluços que eu soluço,
esgares gargalhados que laceram
entram-me no ouvido, pelo sangue, na alma,
Na alma em abandono. Em silêncio o mundo
tão cheio de presságios, de ódios e silêncio.
Mistérios e traições da noite, a todos sofro
como o último dos desgraçados.
Não aves, não flores, não carinhos
mas o negrume, a solidão, este abandono
na noite eterna.
Desde sempre a sofri, não mais me deixará,
Serei o holocausto dos que agora
Esquecem a noite.
E nem poder lançar o olhar em busca das estrelas.
(Vejo além das estrelas)
O VAGABUNDO POETA
Cantarei a erva nos pastos
E o crescimento do sol, com
Suas ramas ríspidas. Cantarei os
Caninos do lobo, e o reflexo de
Sua fome, temperada de duro
Azul. Cantarei a eficácia da
Pedra e o clarão áspero de sua
Nudez. Cantarei algumas palavras, ao
Acaso inscritas num muro, e o silvo
Das locomotivas transviadas, e o vazio
De deus no mundo, e a liberdade na
Morte. Cantarei — sim, cantarei — os
Regalos do homem, seus pulmões absurdos,
O couro de seus sapatos e a vertigem
De sua marcha — extinto diamante.
(In Minérios domados, poesia reunida, seleção e edição de Humberto Werneck, Rio de Janeiro: Rocco, 1993, pp. 204-205)
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