sábado, 13 de fevereiro de 2016

Eugénio de Andrade

Sobre Nuno Guimarães


Raramente amizade e morte me terão procurado quase ao mesmo tempo. Com Nuno Guimarães isso aconteceu. Eu pude ainda falar-lhe da sua poesia violentamente fascinada por essa forma molecular «onde o real oscila no seu leito»; desses campos visuais que se estendiam, roído por um sol lúcido e baixo de fim de outono, entre os territórios privilegiados de Cesário Verde e do último Carlos de Oliveira.


A sua lição, como ele foi o primeiro a afirmar, é realmente dura: uma escrita onde «tensão e atenção acumuláveis» descobrem as zonas de ruptura, a «duplicidade perfeita». Será o poeta o «fomentador da divisão»?

A esta pergunta não teve Nuno Guimarães já tempo de responder, mas a resposta, a mim, que sou como ele «insociável e corrompido por hábitos marítimos», não me faz falta. O que me perturba, agora ao reler os seus versos, é que tenha faltado à promessa de prosseguirmos juntos esse exercício de pastorear o ser.

[In Poesia e Prosa [1940-1979] , vol 2, 1980]




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